MOÇÃO do deputado municipal do BE, Carlos Vieira e Castro, PELA DIGNIFICAÇÃO DO INSTITUTO POLITÉCNICO DE VISEU E OUTROS, DESIGNANDO-OS POR “UNIVERSIDADES POLITÉCNICAS”, OU “UNIVERSIDADES DE ESTUDOS AVANÇADOS”, DE MODO A PODEREM ATRIBUIR O GRAU DE DOUTOR.
Considerando que:
- No dia 22 do passado mês de Outubro, os presidentes dos Conselhos Gerais de 13 institutos superiores politécnicos (de Bragança, Castelo Branco, Cávado e Ave, Coimbra, Guarda, Leiria, Lisboa, Portalegre, Porto, Santarém, Setúbal, Tomar e Viseu) pediram à tutela que autorize estas instituições a utilizarem, em documentos oficiais e de informação ou divulgação produzidos em língua estrangeira, a designação University of Applied Science (Universidade de Ciências Aplicadas), a exemplo do que acontece na EURASHE – Associação Europeia de Instituições de Ensino Superior e ainda que possam outorgar o grau de doutor.
- Já há mais de uma década que o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) tem vindo a reivindicar a passagem destas instituições do ensino superior a “universidades politécnicas” , invocando a desvalorização social deste subsistema de ensino e a evolução do seu corpo docente, que, na realidade, tem aumentado significativamente o número de doutorados, assim como as condições de investigação e de internacionalização. A partir de 2009, com a alteração ao estatuto das carreiras docentes do ensino superior universitário e politécnico que exigia o doutoramento para o ingresso em ambas as instituições e o título de agregado para atingir o topo da carreira, com os mesmos índices salariais, a percentagem de docentes doutorados nos institutos politécnicos tem vindo a aproximar-se dos 50%, o que significa uma evolução assinalável se tivermos em conta que as universidades alcançaram essa percentagem apenas em 2002. O processo de Bolonha veio abrir uma brecha no sistema binário ao uniformizar a designação e duração dos cursos que marcavam a diferença entre os dois subsistemas.
- Alguns politécnicos cientificamente mais bem preparados têm contornado o impedimento legal para atribuírem o grau de doutor através de parcerias com universidades espanholas em programas de doutoramento. Em Espanha, note-se, não há o sistema binário; o ensino equivalente ao politécnico, de carácter, alegadamente, mais prático e profissionalizante, está integrado na Universidade. O mesmo acontece em Inglaterra onde o sistema binário acabou há mais de uma década. Aqui, o paradigma do ensino elitista, residente nas aristocráticas Oxford e Cambridge, deu lugar, há cerca de meio século, a universidades de cariz técnico-científico. Também na Alemanha se demarcou as universidades académicas das escolas técnicas, inibidas de dar títulos universitários, mas estas, graças ao contributo que deram para o desenvolvimento do país, acabaram sendo transformadas em universidades técnico-científicas. Na Suécia, as seis universidades a que estão vinculados dezasseis colégios universitários em termos de investigação, incluem a Universidade de Tecnologia de Lulea e a Universidade Sueca de Ciências Agrárias, para além de pequenas instituições públicas constituídas por uma única faculdade, dedicadas à Medicina e Medicina Dentária, Tecnologia, Educação, Artes, Educação Física e Desportos.
- As escolas politécnicas criadas no século XIX, em Lisboa e no Porto foram, em 1911, integradas nas universidades de Lisboa e Porto, criadas pela primeira República, estando na génese das respectivas faculdades de Ciências. Em 1910, apenas havia em Portugal uma universidade, em Coimbra, com 1.212 alunos, e 32 liceus com 8.691 alunos, numa população com cerca de 75% de analfabetos. Foi também apenas a partir de 1911 que os cirurgiões, formados pelas escolas médico-cirúrgicas de Lisboa e do Porto, criadas durante o liberalismo, passaram a ter em Portugal a mesma dignidade dos médicos formados pelas universidades. Até aí, os médico-cirurgiões, formados em escolas de cirurgia, eram considerados meros trabalhadores manuais, operários especializados, uns práticos, herdeiros dos cirurgiões-barbeiros, como descreveu Ribeiro Sanches, obrigado a exilar-se em 1726: “(…) ao lado dos médicos saídos da única Faculdade do País, a da Universidade de Coimbra, …havia…os cirurgiões mata-sanos, os inchacorvos, os barbeiros sangradores,os curandeiros idiotas, os algebristas, os boticários,as parteiras, os oculistas, os dentistas…” . No entanto, a cirurgia começou a ser considerada digna de ser praticada pelos médicos durante a Renascença, em Itália e na França, quando o trabalho manual foi recuperado pela ciência, com homens como Leonardo da Vinci a dissecar cadáveres humanos e de animais para estudo da Anatomia, depois de mil anos de estagnação e retrocesso científico provocado pelo esclavagismo, defendido por Platão e Aristóteles, que foi relegando para o trabalho escravo as operações manuais que estiveram na origem da experimentação, base do desenvolvimento científico da civilização jónica (Grécia, cerca de 600 a.C.).
- Em Portugal, antes do 25 de Abril só existiam 3 universidades públicas (Lisboa, Porto e Coimbra) e ensino médio nos institutos industriais, institutos comerciais, escolas do magistério primário e escolas de regentes agrícolas. A reforma de Veiga Simão, em 1973, levou à criação do ensino superior politécnico. Com o 25 de Abril veio a necessidade de democratizar o acesso ao ensino superior que esbarrou no conservadorismo elitista da universidade, pouco receptiva a admitir no seu seio cursos de natureza profissional. Em 1975 arrancaram os institutos politécnicos da Covilhã e de Vila Real que em 1979 seriam convertidos em institutos universitários e, em 1986, dariam lugar às Universidades de Trás-os-Montes e Alto Douto e à Universidade da Beira Interior. A Universidade do Algarve, fundiu-se com o Instituto Superior Politécnico de Faro, ambos criados em 1979, pelo que inclui unidades orgânicas do ensino universitário e do ensino superior politécnico. Também a Universidade de Aveiro, criada em 1973, inclui algumas escolas superiores que normalmente seriam agregadas em institutos politécnicos.
- Inicialmente os Politécnicos apenas podiam atribuir o grau académico de bacharelato, evoluindo para licenciaturas bi-etápicas (bacharelato-licenciatura e, mais tarde, licenciatura-mestrado). Hoje, não há razão para não ministrarem doutoramentos.
- Com a presente sobreposição de funções, de cursos, de formação e de investigação, a continuação do actual sistema binário do ensino superior, com universidades e institutos politécnicos, só se compreende por um preconceito elitista que continua a discriminar social e profissionalmente os docentes dos Politécnicos, vítimas maiores da precariedade laboral no ensino superior, que, por exemplo, podem ficar por mais de uma década, após o doutoramento ou outra habilitação de referência, na situação de equiparados a assistente.
- Portugal está longe da massificação do ensino superior, com apenas 19% dos portugueses com esse grau de ensino, quando a média da OCDE (dados de 2012) é de 32%, ficando apenas à frente da Turquia (15%). Portugal não tem licenciados a mais, tem é empregos a menos. Daí a presente “fuga de cérebros” para a emigração. Precisamos de mais investimento no ensino superior, na qualificação e na investigação científica, condição necessária para um desenvolvimento cultural, social e económico sustentável do país.
- A Assembleia Municipal de Viseu, reunida a 19 de Dezembro de 2016, delibera:
- 1. Apelar ao Governo para que dê abertura legal à reivindicação do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, no sentido de alterar a designação “Instituto Politécnico” (que nem tem tradução literal correcta para a língua inglesa) para “Universidade Politécnica” (como defende Nuno Mangas, actual presidente do CCISP) ou “Universidade de Ciências Aplicadas” (tradução literal da designação University of Applied Science, a exemplo do que acontece na EURASHE – Associação Europeia de Instituições de Ensino Superior, mesmo em países que ainda mantêm o sistema binário), de modo a que estas instituições do Ensino Superior, desde que possuidoras das condições previstas na lei e acreditadas pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior – A3ES, possam oferecer cursos de doutoramento e outorgar o respectivo grau académico.
- 2. Enviar esta moção para o Primeiro-Ministro, para o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, para os grupos parlamentares da Assembleia da República, para todas as assembleias municipais e todas as CIM que, à semelhança da CIM Viseu Dão Lafões, tenham na sua área de influência institutos superiores politécnicos, para o presidente do IPV e para o presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos.
O deputado municipal do BE
Carlos Vieira e Castro